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Testemunhos

Os maiores especialistas em afasia são as próprias pessoas que vivem com este problema. Ninguém melhor do que elas para nos ajudarem a perceber o que é a afasia e quais as suas consequências na vida social, familiar…

Neste espaço encontrará os testemunhos de pessoas com afasia, familiares, cuidadores e amigos .

José Carvalho (Pessoa com afasia, sobrevivente de AVC)

Bárbara Maia (Pessoa com afasia, sobrevivente de AVC)

Marlene Silva (Pessoa com afasia, sobrevivente de AVC)

Camilo e Graça (pessoa com afasia, sobrevivente de AVC e sua esposa)

Testemunho de uma pessoa que teve afasasia: “Nós somos Capazes” 

Alcino Gomes, marido de uma pessoa com afasia progressiva

Quando e como se aperceberam que algo não estava bem?

Após o AIT que deu à minha mulher, isto em 1998. Naquela altura os médicos apenas mandaram para casa, sobre imensa medicação. Nada mais havia a fazer

 

Quais as dificuldades de comunicação na altura e agora?

Foi um pouco difícil para ela e para nós, mas depois de em casa a família tentar comunicar sempre com ela, conseguiu recuperar um bocadinho. Agora melhor.

 

Como tem sido a evolução e como têm lidado com isso?

Como digo atrás, a memória ficou afectada. Ao longo deste caminho, arranjamos as chamadas ajudas técnicas, para exercitar a mente. Com alguma agilidade e Paciência

 

O que já aprenderam neste processo?

Que existe sempre uma alternativa, para melhorar a doença, desde que haja boa vontade e possibilidades, dos familiares acompanharem o doente. Muita Paciência

 

O que tem sido mais difícil?

Para mim, foi e é uma situação que de vez em quando aparece – o doente acreditar que estamos ao seu lado, para ajudar e não para complicar. Não é fácil. Paciência.

O que tem ajudado muito?

A experiência colhida das aulas que frequentei no IPA com a minha mulher e que foram o pilar para eu conseguir ter um pouco mais de descanso.

Dão algum conselho a quem esteja a passar pelo mesmo?

Tento sempre dar os melhores conselhos a quem tenha passado ou esteja a passar, pela mesma situação ou pior que o da minha mulher.

De que forma o IPA tem sido uma ajuda?

Como atrás também foquei, foi muito importante o convívio que tive no IPA, com

Várias  pessoas com a mesma patologia, mas com sequelas diferentes, inclusive físicas.

Maria Emília, esposa de uma pessoa com afasia progressiva

Apresentação

  • Maria Emília Rios, tenho 62 anos, e trabalho na Direção de Finanças do Porto.
  • O meu marido chama-se Joaquim Fonseca, tem 65 anos, está aposentado há dois anos e era docente na FEUP.
  • Temos 2 filhos (de 36 e 42 anos), 2 noras e 2 netas (de 3 e 6 anos) , que vivem em Londres.

Doença

  • Em meados de 2014, apercebi-me que o Fonseca revelava um cansaço mental e uma tristeza que não eram habituais. Na altura, como ele precisava de ultimar a tese de doutoramento, mas ía protelando, comecei a ajudá-lo e apercebi-me da sua dificuldade em se concentrar.
  • Inicialmente, pensou-se que fosse um esgotamento provocado pelo excesso de trabalho, mas, após vários exames, foi-lhe diagnosticada uma demência frontotemporal, a qual tem fortes implicações ao nível da comunicação (verbal e escrita) e da compreensão, entre outras.
  • No início, não sentia dificuldades em comunicar com o Fonseca, mas sim em lidar com a tristeza que tomou conta da alegria que o caracterizava.
  • O Fonseca ainda conseguiu defender a tese de doutoramento em meados de 2015, embora com muita ajuda minha, bem como dar aulas até inícios de 2018, embora com uma ajuda cada vez maior dos colegas que o acompanhavam nas mesmas.
  • Apesar dos tratamentos a que tem sido sujeito, quer ao nível de medicamentos quer ao nível cognitivo, a doença foi evoluindo. Atualmente, o vocabulário resume-se à utilização de palavras/frases chave/curtas, a compreensão está limitada a coisas simples e contextualizadas, a leitura é quase nula, a escrita resume-se à assinatura do seu nome e a memória falha mais na verbalização dos nomes dos familiares mais próximos do que na visual.
  • Lidar com a evolução da doença não tem sido fácil, mas já foi mais difícil do que atualmente, ao ponto de ter sentido necessidade de recorrer a apoio psiquiátrico durante cerca de dois anos. Felizmente que, apesar da distância geográfica, os meus filhos se esforçam por estar sempre presentes, ouvindo-me e ajudando-me a tomar as decisões adequadas a cada momento. Felizmente que, em finais de 2018, com a mudança de médico e de toda a medicação, a evolução da demência tornou-se mais lenta, e, não menos importante, o Fonseca recuperou a alegria e boa disposição.

IPA

  • Viemos parar ao IPA em meados de 2018, por intermédio da Dra. Cátia Mateus, a neuropsicóloga que acompanhava o Fonseca através do programa de estimulação cognitiva via NET (CogWeb) e em consulta presencial.
  • No IPA, ouvi falar de afasia pela primeira vez, apesar dela fazer parte da nossa vida há uns anos. No caso do Fonseca, a afasia é progressiva, vai evoluindo ao mesmo tempo que outros sintomas da demência.
  • No caso da afasia progressiva, as diferentes estratégias de comunicação resultam cada vez menos e têm de ser adaptadas à medida que a demência evolui.
  • No IPA, temos tido sessões de terapia da fala, e por vezes de psicologia, em que eu tenho aprendido várias coisas, que então não sabia, nomeadamente:
    • falar mais devagar;
    • utilizar estratégias para comunicar com o meu marido (o recurso ao gesto, escrita, desenho, TLM, fotos, etc);
    • dar importância ao contexto e as rotinas, preferencialmente com ajuda dos familiares próximos;
    • prevenir situações risco/perigo;
    • preparar-me para a evolução da doença;
    • privilegiar a qualidade do tempo à quantidade;
    • mas também, tomar consciência de que preciso de estar bem para que o Fonseca esteja bem.
  • No IPA, aprendi que o cuidador assume um papel fundamental neste processo. Sinto que a minha relação com a doença melhorou desde que estamos a ser apoiados pelo IPA, quer na gestão diária, quer na gestão de expetativas futuras.
Fátima Ruivo, esposa de uma pessoa com afasia, sobrevivente de um AVC

A 21 de Maio de 2019, o meu marido sofreu um AVC hemorrágico, e uma das sequelas com que ficou foi a afasia.

Nos dias a seguir ao AVC não conseguia comunicar com o meu marido, ele articulava palavras soltas que eu tinha dificuldade em ligar, recorri a desenhos, grafismos e até palavras na tentativa de conseguir comunicar com ele. Os dias foram passando e a comunicação entre nós era difícil. Por vezes ele trocava o significado das palavras e tornava cada vez maior o meu desespero. Eu notava que ele ficava nervoso por não o entender, mas não sabia como ajudá-lo.

Só quando ele foi para o Centro de Reabilitação do Norte (CRN), é que me explicaram que ele tinha afasia mas com ajuda da terapia da fala ele iria melhorar e assim aconteceu. Dia após dia, a comunicação entre nós melhorava, a seguir às palavras começaram a surgir as frases e o problema da comunicação começou a ser ultrapassado. Por vezes, ele tem dificuldade em encontrar a palavra certa para construir as frases mas aprendi que preciso de dar tempo porque o processo de resposta às vezes é lento, incentivá-lo a usar frases curtas, linguagem simples e tentar que ele use outras formas de comunicação e nunca o excluir das conversas.

A entrada no Instituto Português da Afasia (IPA) veio melhorar o problema linguístico bem como outros défices cognitivos. Sou muito grata a toda a equipa do IPA por ter ajudado o meu marido a melhorar as suas competências e a mim por me ter auxiliado a ultrapassar esta fase tão complicada da nossa vida. No IPA o meu marido tem desenvolvido novas competências, enfrenta novos desafios aumentando assim a sua auto-estima, mantendo-nos focados na sua recuperação.

O que interessa neste momento é aprender a viver com o AVC, e com ele recomeçar uma nova vida. Há que manter o foco na recuperação, todos os dias é uma aprendizagem com novos desafios e conquistas, de momentos de alegria, outros nem por isso. Temos de usar as novas ferramentas para que o dia-a-dia se torne mais leve e acima de tudo aceitar esta nova realidade e ACREDITAR que o amanhã será melhor.

Grupo de amigos da Carla Cadilhe

Somos amigas da Carla Cadilhe há muitos anos e o que sucedeu na madrugada de 26/12/2016 tornou-nos ainda mais unidas num mote comum: partilhar amor e carinho com quem tanto merece e tanto nos dá.

A Afasia era uma palavra desconhecida para todas nós, mas pela qual ganhamos o maior respeito e descobrimos uma forma diferente de estar nesta vida. Tomamos contacto com a palavra quando a Carla iniciou a terapia e somos testemunhas do quanto evoluiu desde então.

O que fizemos para ajudar?

Pouco, face à determinação inata na Carla, mas procuramos estar sempre por perto presencial ou virtualmente (as vezes a vida assim obriga) com mensagens de amor e incentivo.

Se isso foi importante?

A Carlinha melhor avaliará, mas achamos que sim, tudo fizemos e fazemos por isso e por este processo de aprendizagem também para nós. Perceber que a comunicação que verdadeiramente interessa não se faz com o débito de palavras ritmadas e em ondas rápidas, mas faz-se sim de olhares e gestos cúmplices com respeito e muito amor.

Como a Carla o viveu?

A força interior, garra, coragem, foco, determinação (despejávamos aqui um dicionário inteiro e nem por sombras conseguiríamos descrever a perseverança desta grande amiga) e claro a muita fé da Carla são o resultado do tanto que ela evoluiu.

Se a nossa relação mudou?

Mudou, tornou-nos mais próximas, mais sensíveis as fragilidades de cada uma e de todas e trouxe uma ainda maior admiração pela nossa “lutadora”.

Aprendemos e continuaremos a aprender muito com a Carla e esperamos poder continuar a ter a honra de a apoiar e de ser apoiadas por ela nesta jornada que é a vida. A Carla é uma força da natureza e o seu espírito positivo contagia-nos sempre.

O que foi mais difícil?

Saber que a Carla gostava de mais. A espera dos primeiros tempos em que os resultados tardavam a chegar e a ânsia de ter a nossa amiga de volta.

Onde a Carla foi buscar a força para tudo isto? Boa pergunta? Corre-lhe no sangue pelo amor incansável da sua família e a sua força interior, devoção e fé.

O que aprendemos?

Para comunicar melhor temos que dedicar tempo à conversa, nunca interromper e rir muito juntas, pois rir é sempre o melhor remédio!

Maria das Graças, amiga do António Melo

Só percebi o que é a afasia quando o Melo teve o AVC, na cirurgia, e deixou de conseguir falar como até aí.

Somos um grupo de amigos que viaja e se encontra com frequência para um café, uma cerveja com tremoços na esplanada, um jantar, projetos de viajem…

Inicialmente tudo era novo e todos procurávamos a melhor forma de comunicar, mas quem sempre nos ajudou foi o próprio Melo. Dono de uma inesgotável força de vontade e empenho empregou toda a energia que tinha e que não tinha para enfrentar a nova realidade. Conseguiu seguir, do mesmo modo, o seu percurso de vida e continuou a empreender novos projetos.

Na realidade, nada mudou na nossa forma de estar. O mesmo grupo continua a fazer as reuniões habituais, a estar presente nos bons e menos bons momentos, a fazer projetos de férias e a realizá-los.

O IPA teve um papel fundamental na evolução da comunicação do Melo e, particularmente, na forma de encarar a sua nova forma de comunicar. Já não se zanga tanto quando não se faz entender rapidamente!

Por vezes não consigo perceber de imediato o que me está a dizer, mas ele é tão generoso que procura imensas pistas para que eu chegue lá!

Tenho uma admiração imensa por este Amigo fantástico.

 

Maria Helena Teixeira, esposa de de uma pessoa com afasia

A afasia é um distúrbio da comunicação adquirido, que interfere na capacidade de processamento da linguagem, sem afetar a inteligência; prejudica a capacidade de falar e de compreender e, em muitos casos, a leitura e a escrita. Como tal, é uma das sequelas mais incapacitantes de um acidente vascular, sendo extremamente difícil para o doente, mas também para a sua família, que se vê angustiada ao tentar adaptar-se a esta realidade castrante e arrebatadora…

… a pessoa que partilha connosco uma história de vida, de repente, está perdida, presa em si mesma, incapaz de comunicar e de se fazer entender…

A frustração cresce em nós, família, ao tentarmos desesperadamente entender, ajudar e procurar ultrapassar a angústia e a incapacidade. Durante este longo processo, procurei nunca me esquecer que a inteligência não foi afetada, esforçando-me por comunicar com o meu marido sem ser condescendente… admito que a paciência se esgotou muitas vezes, pois o processo era novo para os dois, tendo de haver aprendizagens de ambas as partes.

Mais de um ano passou… os resultados estão à vista! A autonomia foi reposta, já é possível um convívio real e ativo! A comunicação flui!!! Ficaram umas palavras trocadas pelo meio, mas que já nos sabemos rir delas, o que também é muito importante! Estou feliz pelas conquistas conseguidas em família, mas também com a preciosa ajuda de toda a comunidade do IPA, a quem agradeço do fundo do coração.

Nunca sabemos a força que temos até que a única alternativa que nos resta é sermos fortes.

Ao meu marido, queria dizer que vencer na vida é transformar o sofrimento em aprendizagem, pois, como resultado do AVC e respetivas sequelas, aprendeu a dar mais valor à vida, ao convívio genuíno; quero que saiba que valorizo e reconheço todas as conquistas que alcançou, pois estive sempre ao seu lado para as festejar e partilhar. As cicatrizes que temos, provam que houve feridas que sararam; são marcas que só um guerreiro possui.

Manuel Gomes, cuidador de uma pessoa com afasia progressiva

Já foi no ano de 2016 que me apercebi que se passava algo com a Manuela. A simples colocação de um cinto nas calças alertou-me para uma possível alteração no quotidiano, a verdade é que uma coisa tão simples se tornou numa grande dor de cabeça. A partir daí procuramos ajuda, pois o tempo foi passando e as dificuldades começaram a ser maiores, colocação de talheres na mesa, limpeza, passar a ferro, escrever, somar, subtrair, etc.

Depois dos exames médicos confirmarem ser uma demência fronto-temporal. A ajuda chegou através de uma amiga, funcionária da câmara de Matosinhos que nos indicou o IPA. A médica da Manuela simplesmente ignorou a situação dizendo que não podíamos fazer nada (incrível). Foi a melhor decisão que tomei ao recorrer ao IPA, pois sabendo que pouco podemos fazer quanto à doença, arranjei ferramentas que me ajudam, e muito, a comunicar com a Manuela de uma forma mais saudável.

Sei também que é um processo penoso e duro, mas sem dúvida apercebi-me que sem a ajuda do IPA não conseguia ultrapassar as várias etapas desta doença, essencialmente da comunicação, e esclarecendo também aos cuidadores, que passamos todos por momentos difíceis e que algumas reações que porventura temos são perfeitamente naturais.

Afinal sou igual aos outros e isso deixa-me mais descansado. Duro, nesta etapa, é saber que o futuro nos reserva um caminho que é irreversível, mas temos que estar presentes e tentar levar esta nova vida da melhor forma possível.

A Manuela não tem medo do que aconteceu, foi uma infelicidade que nos aconteceu. Ela merece todo o apoio e carinho que lhe possa transmitir nesta nova etapa de vida.

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